
Pela tarde surda e morna, eu menino com chapéu de palha, camisa xadrez, short amarelo e o sujo borzeguim, seguia à-toa por entre as alamedas de café. Eu tinha o mundo todo e caminhava supondo histórias de outros tempos por aqueles chãos de macio pisar. Lembro que logo depois das goiabeiras vinha o flamboyant vermelho e a cerca da horta solitária, verdade é que não se via gente em canto algum, só mesmo os silêncios. Depois de passar o pequeno portão de taboas, o cheiro de terra úmida e planta perfumada enchia as narinas. Ah, como ali era bom!
Lá, bem no meio, num chão mais duro, havia uma aguinha fininha bem transparente que se podia beber, ela tinha um espraiado cercado de agrião verdinho, com suas florinhas e raízes brancas. Ali eu gostava de demorar... Com a ponta do dedo acariciava as folhas pequenas e arredondas, admirava os pequenos insetos voadores por um tempão. Bebia muita água e deitava com a barriga virada pro céu, braços abertos e sorrindo sem porque nenhum.
Naquela tarde eu existi pra sempre.
Hoje, se me deito olhando pro céu, ele ainda está tão distante e azul como naquele dia pleno, mas já não há mais silêncios a me rodear, ouço muitos ruídos do meu passado e a aguinha do agrião corre quieta pelo canto dos meus olhos.
tuluca
São Paulo, 21 de janeiro de 2012
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[Brinquei com o pretérito dos verbos, pois que esse dia foram muitos e boiam na memória]
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