terça-feira, 7 de abril de 2015
A pedrinha de estrelas
Olhando mais suavemente pras violentas maldades do mundo, paro e não prossigo adiante, estaciono. Penso em mim, neste jeito um pouco tristonho de olhar para a vida. Sempre buscando maneiras de trazer entusiasmo e alegria pros meus dias e o dos outros.
Foi no tempo onde todos os dias guardam aventuras impares e novidades sem igual.
Aconteceu num daqueles dias cheios de muito sol e silêncio. Eu menino andava à-toa pelo areão na beira do corguinho marulhento, quando de repente acho na areia uma pedrinha branca e pequenina, que rebrilhava ao sol como se tivesse milhares de estrelas, tomei-a nas mãos e brinquei por muitas horas, intrigado com a beleza dela. Dentro d'água o brilho cessava. então eu esperava pacientemente ela secar só pra encantado vê-la brilhar novamente.
Estive assim perdido por um tempo de nem sei, mirando estrelas naquele pequeno universo só meu. Apenas eu soube dele e agora você, posso te dizer que foi um dia muito bom e ainda não acabou.
Uns cinquenta anos depois, eu estive numa cidade próxima desse lugar de muita infância, bateu uma saudade enorme daqueles dias, daquele Eu que de tudo se admirava sonhava e aprendia. Assestei o carro em direção ao córrego, à horta, o capinzal, enfim rumei pra um tempo que não existe mais. Dirigi alguns quilômetros, mas logo parei no acostamento pensando no que estava fazendo. Dei meia volta; não poderia ir pr’aqueles dias azuis de não ter fim. Aquele lugar não existe mais neste tempo, hoje ele habita o transcendente de quem sou, fica vivo na pedrinha que continha o firmamento. Ela como eu, existe apenas no que quero de mim mesmo, no doce descobrir das pedras ensolaradas de viver e amar.
Voltei dali, assim como volto a mim depois que a música termina; sempre sabendo que o que tive e sinto, estarão em mim enquanto eu tiver luz no coração. Depois que eu me for, alguém ainda sorrira com a criança do córrego ensolarado. Na arte mora a salvação pra toda dor e o vazio da existência, na arte o começo de tudo, toda a magia de sermos humanos e podermos ser mais que nós mesmos.
A triste alegria é a graça de saber-se humano. É o modo suave de fluir junto pela natureza, transformando o tempo em um período só, sem começo e sem fim, onde tudo vive e calmamente recomeça sempre.
Assim ensandecido escrevo estas palavras do meu Eu, este Eu que nada sabe e ainda experimenta molhar as pedrinhas pra fazer sorrir uma moça querida.
Ainda aí?
tuluca
São Paulo, 5 de abril de 2015
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[Sobre o que vive sempre e não existe, mas que sempre insiste e vivifica, apesar do tempo]
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2 comentários:
É um dos textos mais comoventes que jamais li, mestre
Grato pelo elogio. Ter um parâmetro do que se é escreve é valiosissimo.
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